quinta-feira, 26 de março de 2015

Memórias #6 | Jorge Loredo (1925 - 2015)

Espalhadas por todos os cantos, garotas deste Brasil Varonil acordaram na manhã de hoje viúvas de Jorge Loredo, ou melhor, Zé Bonitinho “o prerigote das mulheres”. Internado a quase dois meses em um hospital da Zona Sul do Rio de Janeiro, o comediante faleceu, aos 89, vítima de complicações de uma doença pulmonar crônica.

Ator, humorista e, paralelamente, advogado, Jorge Loredo era o típico suburbano carioca, aquele que acaba enfrentando, invariavelmente, muitas dificuldades desde cedo. Filho de família simples e criado no bairro de Campo Grande, aos 12 anos foi diagnosticado com osteomielite (inflamação nos ossos) na perna esquerda. Sofrendo de dores constantes, Loredo preferia ficar recluso, o que acabou o transformando em uma criança introvertida. Ainda na juventude, aos 20 anos, o ator foi internado em um sanatório, para o tratamento de uma tuberculose.

Incentivado por seus médicos, Jorge Loredo começou a participar de um grupo teatral do hospital para enfrentar o seu problema com a timidez e a sociabilidade e, neste momento, descobriu sua vocação para ator. Ao receber alta, Loredo procurou uma escola de teatro profissional sempre em busca de papéis dramáticos porém, em sua primeira audição, o ator representou, contra a sua vontade, o monólogo cômico “Como Pedir uma Moça em Casamento”. Aprovado, passou a dedicar a sua carreira ao humor e as comédias.

Ícone do humor, Jorge Loredo dava vida a Zé Bonitinho há mais de 50 anos - Divulgação

A figura de Zé Bonitinho, maior sucesso do ator, foi sendo construída aos poucos. O conquistador barato de bigodinho ralo e topete frondoso arquitetado à base de uma lata inteira de Gumex era O Bárbaro, personagem de Jorge Loredo em “Noites Cariocas”, programa da extinta TV Rio na década de 60. As roupas extravagantes, os trejeitos exagerados e o leque de cantadas sofríveis foram sendo incorporados aos poucos, mas a “inigualável beleza” do Bárbaro era tão clarividente que foi a principal responsável por rebatizá-lo. Zé Bonitinho, “o amigo do peito da mulherada”, enfim ganhava vida.

A marca Zé Bonitinho sempre foi uma das mais icônicas da comédia nacional e ao longo de décadas esteve presente nos principais programas do gênero na televisão brasileira. Loredo começou dividindo o eterno banco de Manuel de Nóbrega na “Praça da Alegria” com outros gênios do humor como Ronald Golias e Moacyr Franco. O ator ainda trabalhou com Chico Anysio, inclusive em “A Escolinha do Professor Raimundo”, e retornou “ao mesmo banco” trabalhando com o filho de Manuel, Carlos Alberto de Nóbrega, em “A Praça é Nossa”.

Entretanto, toda a convergência de talento e genialidade de Jorge Loredo (e, consequentemente, Zé Bonitinho) pode ser conferida em “Sem Essa, Aranha” (1970), de Rogério Sganzerla, uma das obras mais representativas do Cinema Marginal Brasileiro. No longa Loredo interpreta o banqueiro Aranha, um cafajeste nato que se relaciona com três mulheres diferentes, cada uma integrante de uma classe social diferente. Carregada de humor negro, o filme penetra de forma escatológica no drama social do país. Por vezes Aranha e por vezes Zé Bonitinho, a personagem principal é a representação escarrada de uma desorientada burguesia. Obrigatório para qualquer brasileiro, “Sem Essa, Aranha” é uma erupção de clandestinidade.

Jorge Loredo como Zé Bonitinho em "Sem Essa, Aranha" (1970) de Rogério Sganzerla - Belair Filmes [br]

Jorge Loredo atuou em poucos filmes (dez ao todo), mas a sua presença em cena era sempre marcante. Mesmo nas produções em que não interpretava a sua personagem mais marcante, Jorge Loredo sempre apresentava com elementos típicos associados ao caricato Zé Bonitinho, principalmente nos figurinos chamativos ou nos acessórios vistosos. Dentre seus principais trabalhos estão “O Abismo” (1977), também de Sganzerla; “Tudo Bem” (1978) de Arnaldo Jabor; e “Chega de Saudade” (2007) de Laís Bodanzky. Sua última aparição no cinema foi no longa “O Palhaço” (2011) de Selton Mello.

Longe da televisão há alguns anos, Zé Bonitinho partiu sem nos deixar, pela última vez, o seu famoso tilintar de sobrancelhas e aquele “tostão de sua voz”. Entretanto, aplausos não faltarão para esse genuíno ícone do humor. O mundo está ficando cada vez mais chato e sem graça, pois os verdadeiramente bons estão indo embora.

Descanse em paz... (1925 - 2015)

Dez filmes com Jorge Loredo que indico (em ordem de predileção):

01 - Sem Essa, Aranha (1970) - de Rogério Sganzerla

02 - Chega de Saudade (2007) - de Laís Bodanzky

03 - O Abismo (1977) - de Rogério Sganzerla

04 - A Espiã que Entrou em Fria (1967) - de Sanin Cherques

05 - Um Caso de Polícia (1959) - de Carla Civelli

06 - Sai Dessa, Recruta (1960) - de Hélio Barroso

07 - Tudo Bem (1978) - de Arnaldo Jabor

08 - Câmera, Close! (2005) - de Susanna Lira

09 - A Suprema Felicidade (2010) - de Arnaldo Jabor

10 - O Palhaço (2011) - de Selton Mello

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