A nobre e rara oportunidade de poder trabalhar com grandes
cineastas como Akira Kurosawa, Hiroshi Inagaki, Mikio Naruse e, principalmente,
Yasujirô Ozu, fizeram de Setsuko Hara uma das artistas mais consagradas da
história, transformando-a também no símbolo e no rosto mais famoso de uma era
gloriosa para o cinema japonês: “A Era de Ouro” compreendida, principalmente,
entre o final dos anos 40 e início dos anos 60.
A sempre carismática atriz morreu no dia 5 de setembro, aos
95 anos, em um hospital da Prefeitura da Província de Kanagawa. Segundo os familiares,
que resolveram divulgar a nota oficial de falecimento somente na noite de ontem
(dia 25 de novembro), Hara vinha lutando há alguns meses contra uma severa
pneumonia que se agravou no mês agosto.
Nascida em Yokohama em 17 de junho de 1920, Setsuko Hara fez
a sua estreia no cinema com apenas 15 anos em “Tamerau Nakare Wakodo Yo” (1935) de Tetsu Taguchi. Entretanto, a
atriz alcançou a fama dois anos mais tarde ao protagonizar o polêmico “A Filha do Samurai” (1937), uma
coprodução entre o Japão e a Alemanha Nazista que, à época, foi mal vista aos
olhos do público nipônico. Eles consideravam condescendente o tratamento dado
ao Japão pelo diretor Arnold Fanck, que retratava o país como uma nação
asiática exótica que precisava ser influenciada com urgência pelos ideais
políticos alemães.
A atriz japonesa Setsuko Hara (1920 - 2015) em "Banshun" (1949) de Yasujirô Ozu - Shôchiku Eiga [jp] |
Embora cercado de polêmicas que se desdobraram para além do
campo artístico, o filme não deixou de ter a audiência cativa de um grande
público. Atraídos por uma feição exuberante que conseguia, ao mesmo tempo,
esconder e destacar os seus traços orientais mais marcantes, fãs acabaram sendo
hipnotizados pelo olhar puro e encantador de uma garota que, a partir dali,
despontava para ser uma das maiores revelações da arte dramática e referência
para os jovens no Japão.
Até a sua primeira parceria com Yasujirô Ozu em “Pai e Filha” (1949), Setsuko Hara
atuou em mais de 30 filmes sendo, na sua maioria, pequenas produções. Isso não
impedia que, dentre elas, pudéssemos encontrar grandes preciosidades como “Hebihimesama” (1940) de Teinosuke
Kinugasa; “Shôri no hi Made” (1945)
de Mikio Naruse; e o belíssimo “Juventude
sem Arrependimento” (1946) do mestre Akira Kurosawa, apenas em seu sexto
longa-metragem, na época. As obras desse período eram extremamente singelas,
poéticas e, ao mesmo tempo, realistas. Os filmes retratavam, principalmente, a
fragilidade de um país completamente devastado procurando o seu soerguimento no
período do pós-guerra.
Frente à essas características Hara, por sua vez,
habitualmente interpretava personagens modernas e emancipadas, mulheres
virtuosas e libertas das algemas dos costumes feudais que eram impostas pelo
Império Japonês antes dos conflitos mundiais. A personalidade forte e a notada
independência frente às câmeras (assim como na sua vida pessoal) faziam com que
a maioria dos críticos de cinema comparassem a atriz com as principais estrelas
do da indústria hollywoodiana, como Katharine Hepburn e Joan Crawford, por
exemplo.
O estrelato da atriz foi alcançado com muito trabalho e,
como consequência disso, outras dezenas de trabalhos surgiram ao longo de uma
brilhante carreira. A sua já dita união profissional de sucesso com Ozu é tão
grandiosa (ao todo foram seis filmes juntos) que mereceria um capítulo à parte
em nosso blog, mas não podemos deixar de destacar nessa homenagem que um dos
clássicos absolutos da História do Cinema, “Era
uma Vez em Tóquio” (1953), surgiu justamente dessa parceria. Conhecida
também como “a eterna virgem” (pelo fato de nunca ter se casado), Setsuko Hara
já era considerada uma atriz lendária em vida, mesmo tendo se aposentado
precocemente em 1966, aos 46 anos. Optando pela reclusão total, ela negava a
participação em eventos, evitava entrevistas e fugia de fotógrafos, tal como
Greta Garbo.
Mesmo com a atriz resguardada à vida privada por décadas, seus
filmes e suas atuações sempre estavam presentes nas memórias inveteradas de
cinéfilos e de fãs. E agora, a partir de 2015, ano de sua morte, toda a
carreira e todos os trabalhos de Setsuko Hara ficarão para a eternidade!
Que se preserve a História! E que, agora, Setsuko descanse
em paz... (1920 - 2015)
Dez filmes com Setsuko
Hara que indico (em ordem de predileção):
01 - Era uma Vez em
Tóquio (Tôkyô Monogatari, Japão, 1953)
- de Yasujirô Ozu
02 - Pai e Filha (Banshun, Japão, 1949) - de Yasujirô Ozu
03 - Vida de Casado (Meshi,
Japão, 1951) - de Mikio Naruse
04 - O Idiota (Hakuchi,
Japão, 1951) - de Akira Kurosawa
05 - Também Fomos Felizes (Bakushû, Japão, 1951) - de Yasujirô Ozu
06 - Fim de Verão (Kohayagawa-ke
no Aki, Japão, 1961) - de Yasujirô Ozu
07 - Crepúsculo em Tóquio (Tôkyô Boshoku, Japão, 1957) - de Yasujirô Ozu
08 - Dia de Outono (Akibiyori,
Japão, 1960) - de Yasujirô Ozu
09 - A Filha do Samurai (Atarashiki Tsuchi, Japão | Alemanha, 1937) - de Arnold Fanck e
Mansaku Itami
10 - Juventude sem Arrependimento (Waga Seishun ni Kuinashi, Japão, 1946) - de Akira Kurosawa
Setsuko Hara (em primeiro plano) entre Chieko Higashiyama e Chishû Ryû rodando "Tôkyô Monogatari" (1953) de Ozu Shôchiku Eiga [jp] |
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