quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Marcando um mês do falecimento de Chantal Akerman, Cine Humberto Mauro homenageia a cineasta com a exibição do clássico “Jeanne Dielman” na sua tradicional “História Permanente do Cinema”

Chantal tinha 65 anos de idade; e ainda era jovem, muito jovem. Porém, a melancolia e a depressão que a consumiam (a diretora sofria de transtornos maníaco-depressivos) fizeram-na dar um fim à própria vida no dia 5 de outubro deste ano.

Nascida em Bruxelas, Chantal Akerman iniciou a carreira de cineasta no final da década de 60 com o curta-metragem “Saute ma Ville” (1968) e, a partir dos anos 70, não parou mais, lançando, ano a ano, uma série de trabalhos que flanavam por vários gêneros, incluindo comédias românticas, curtas existencialistas e documentários plurais. Akerman é considerada uma das pioneiras do cinema experimental e feminista, sendo ainda uma das primeiras mulheres a se interessar e a trabalhar o “cinema de autor”, tendo o francês Jean-Luc Godard como principal referência. A belga se tornou, também, grande influência na forma de fazer cinema de alguns dos diretores contemporâneos mais conceituados, como os norte-americanos Gus Van Sant e Todd Haynes, por exemplo.

Abordando basicamente e criticamente o quadro comportamental da classe média europeia, sempre se atendo aos dilemas femininos, Chantal Akerman conseguia relacionar, de maneira bem suave, os problemas políticos mais comuns de uma sociedade com a subjetividade latente de suas personagens. Entre os seus trabalhos mais relevantes podemos destacar: “Os Encontros de Anna” (1978) e “Toda uma Noite” (1982), ambos protagonizados por Aurore Clément; “Um Divã em Nova York” (1996), comédia romântica com Juliette Binoche e William Hurt; e o drama “proustiano” “A Prisioneira” (2000). A diretora ainda se preparava para lançar o documentário ensaísta “No Home Movie” (2015), que acompanhava os momentos mais reservados da vida de sua mãe, Natalia Akerman, uma judia polonesa sobrevivente dos campos de concentração de Auschwitz e uma de suas principais inspirações e motivações para continuar a fazer filmes.

Com a aproximação da fase de finalização do documentário e com a morte da mãe, há apenas um ano, o sofrimento de Chantal provavelmente se agravou, fazendo com que ela, infelizmente, se despedisse deste mundo da maneira mais triste e breve possível.

A cineasta belga Chantal Akerman (1950 - 2015) - Divulgação

Em uma carreira brilhante e singular à qual também se somaram trabalhos como atriz, produtora e roteirista, Chantal Akerman ainda tinha em “Jeanne Dielman” (1975) o seu principal cartão de visitas. O longa talvez seja o mais conhecido da diretora; ele promove um recorte fiel do ritmo exaustivo e desgastante de nossas vidas, e nos faz questionar qual é o verdadeiro sentido das coisas, colocando o dedo na ferida que foi gerada por um vazio existencial que relutamos em admitir que não vivemos. Uma aula de cinema e uma obra essencial para àqueles que procuram estabelecer uma relação mais estreita com o cinema, bem como todas as suas teorias, práticas e reflexões.

O filme acompanha, basicamente, a rotina de uma solitária e jovem dona de casa em seus afazeres diários. Viúva, metódica e mãe de um adolescente, Jeanne (Delphine Seyrig) ocasionalmente se prostitui na própria residência a fim de levantar uma renda extra. Intercalando de maneira meticulosa e mecânica os programas com os clientes e as tarefas domésticas, Jeanne vai levando uma vida que beira o enfado. Entretanto, um “ponto fora da curva” acaba quebrando a engrenagem moribunda de sua vida, nos convidando para uma imperdível experiência voyeurística.

Como forma (in)consciente de homenagear a carreira de Chantal Akerman e presentear o público da capital mineira com uma das obras mais relevantes do cinema europeu, “Jeanne Dielman” será exibido hoje na “História Permanente do Cinema”, realizada semanalmente no Cine Humberto Mauro. Evento tradicional no circuito cultural da cidade há alguns anos, a mostra é contínua e exibe, sempre às 17:00 de todas as quintas-feiras, sessões comentadas de clássicos absolutos da história do cinema. A programação é sempre especial, pois o filme escolhido dialoga com a Mostra que está em cartaz no espaço. No caso desta semana, o filme de Akerman dialoga com a Mostra “Cineastas Mineiras”, que já está em seu último dia de exibição, mas que privilegiou, ao longo de duas semanas, filmes dirigidos e produzidos por diretoras de Minas, profissionais tão visionárias e competentes quanto a belga e que contribuem muito para tornar o Cinema Nacional cada vez mais respeitado e valorizado, tanto pelo público daqui quanto para os admiradores de outros países.

"Jeanne Dielman, 23, quai du Commerce, 1080 Bruxelles" (1975) de Chantal Akerman - Paradise Films [be] | Unité Trois [fr]
Ministère de la Culture Française de Belgique [be]

É importante lembrar que a entrada para a sessão de hoje é gratuita, mas é necessário retirar os ingressos na bilheteria do cinema meia hora antes do início da projeção. Após a exibição, a documentarista, pesquisadora e doutora em cinema Clara Maia fará uma breve explanação sobre o filme seguida de debate com o público.

O Cine Humberto Mauro está localizado no Palácio das Artes, na Avenida Afonso Pena 1537, centro de Belo Horizonte.

UM BOM FILME, E VIVA CHANTAL AKERMAN!

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