sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Memórias #14 | Carlos Manga (1928 - 2015)

No dia em que a Televisão Brasileira comemora os seus 65 anos de inauguração, abrimos espaço para lamentar a morte de um dos maiores nomes dessa longa trajetória. Grande colaborador da fábrica de sonhos em que se transformou este veículo de comunicação (desde a sua existência), o produtor e diretor carioca Carlos Manga faleceu no início da noite desta última quinta-feira, dia 17 de setembro, aos 87 anos, em sua residência.

Cabe lembrar, entretanto, que o renome e parte da genialidade de Carlos Manga começaram a ser construídas através da sua carreira no cinema. Muito antes de ingressar na TV no final da década de 60, o diretor foi um dos principais profissionais que, por trás das câmeras, comandavam as produções da Atlântida Cinematográfica, companhia responsável por alavancar e projetar o Cinema Brasileiro para o seu período de maior apelo popular e com características ao mesmo tempo ingênuas e escrachadas. O momento ficou conhecido de maneira usual como “A Era de Ouro das Chanchadas”.

A convite do ator, cantor e amigo Cyl Farney, principal rosto da Atlântida na época, Carlos Manga abandonou o emprego de bancário para se aventurar no mundo mágico e inventivo das produções cinematográficas começando, primeiramente, como almoxarife e contrarregra do estúdio no Rio de Janeiro. Adquirindo experiência aos poucos, conquistando posições e ascendendo profissionalmente, não demorou muito para que ele integrasse equipes de montagem e produção, passando rapidamente pela assistência de direção, codireção e, por fim, direção.

Sob o selo da Atlântida, Carlos Manga realizou 22 longas-metragens em pouco mais de dez anos, desde o musical “Carnaval Atlântida” (1952) até a absurda comédia “As Sete Evas” (1962), com Farney e a musa Odete Lara no elenco (filme que marcou o encerramento das atividades da produtora). Nesse período, o cineasta ainda teve a oportunidade de trabalhar com as principais estrelas e astros da chanchada como Eva Todor, Grande Otelo, José Lewgoy, Zezé Macedo e o seu maior colaborador e parceiro, o mestre Oscarito (que estrelou 17 desses filmes).

De fato, a parceria entre Carlos Manga e Oscarito nos rendeu e ainda nos renderá muitas risadas. O conjunto de obras vai desde filmes menores como “Pintando o Sete”, “O Cupim” e “Cacareco Vem Aí” (todos de 1960); até clássicos absolutos como os anteriores “Nem Sansão, nem Dalila” (1955) e uma das mais deliciosas sátiras feitas à Guerra Fria através do fabuloso “O Homem do Sputnik” (1959).

O produtor e diretor carioca Carlos Manga (1928 - 2015) - Divulgação 

Carlos Manga ainda foi considerado o maior responsável por inovar na forma de se fazer comédia no Brasil, empregando às narrativas sátiras extravagantes e adicionando às situações elementos surpresa que valorizavam as piadas. O diretor também era especialista em paródias e nos ofereceu em um de seus principais trabalhos, o espirituoso e debochado “Matar ou Correr” (1954), uma crítica fantástica ao gênero mais popular dos Estados Unidos à época: o faroeste. Mais uma vez com Oscarito e Grande Otelo no elenco, o longa acaba encarecendo e pegando emprestado elementos de “Matar ou Morrer” (1952) de Fred Zinnemann.

A capacidade criativa e o talento que o diretor tinha para a comédia permitiram que ele ainda comandasse temporadas de algumas das séries de maior sucesso da televisão como “Chico Anysio Show” e “Chico City”, ambas em colaboração com Chico Anysio; e “Os Trapalhões”, talvez o maior fenômeno de audiência dentre os programas da grade humorística da Rede Globo de Televisão. Foi, inclusive, com a trupe comandada por Renato Aragão que Carlos Manga realizou o seu último trabalho para o cinema: “Os Trapalhões e o Rei do Futebol” (1986) que ainda contava com a modelo Luiza Brunet e o jogador Pelé no elenco.

Como produtor, Carlos Manga continuou a enriquecer seu currículo com grandes trabalhos para a televisão em novelas inesquecíveis como a hilariante “Vamp” (1991), o remake bem-sucedido de “Anjo Mau” (1997), e o estrondoso “Torre de Babel” (1998), além da elogiada minissérie “Agosto” (1993). Na direção (de núcleo ou geral), assumiu o controle de seriados voltados para o público infanto-juvenil como “Sandy & Junior” (1999 - 2002) e a penúltima temporada do novo “Sítio do Pica-Pau Amarelo” (2006) dirigindo, neste último, um total de 185 episódios.

Cabeças pensantes e interessadas como as de Carlos Manga são cada vez mais raras na indústria e no mercado do entretenimento e da cultura, cada vez mais voltados para a arrecadação e para a produção à toque de caixa (incluindo a empresa pela qual o diretor trabalhou nas últimas décadas).

De forma bem sintética, Manga presava pela simplicidade e ainda tentava trabalhar por amor. Por esse motivo (e por todos os outros) se tornou um dos maiores da história!

Que agora descanse em paz... (1928 - 2015)

Dez filmes dirigidos por Carlos Manga que indico (em ordem de predileção):

01 - O Homem do Sputnik (O Homem do Sputnik, Brasil, 1959)

02 - Matar ou Correr (Matar ou Correr, Brasil, 1954)

03 - Nem Sansão, nem Dalila (Nem Sansão, nem Dalila, Brasil, 1955)

04 - Assim era a Atlântida (Assim era a Atlântida, Brasil, 1975)

05 - Os Dois Ladrões (Os Dois Ladrões, Brasil, 1960)

06 - O Marginal (O Marginal, Brasil, 1974)

07 - Quanto mais Samba Melhor (Quanto mais Samba Melhor, Brasil, 1960)

08 - A Dupla do Barulho (A Dupla do Barulho, Brasil, 1953)

09 - As Sete Evas (As Sete Evas, Brasil, 1962)

10 - Carnaval Atlântida (Carnaval Atlântida, Brasil, 1952)

Os parceiros Grande Otelo e Oscarito em "Matar ou Correr" (1954) de Carlos Manga - Atlântida Cinematográfica [br]

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