Renegado por muitos,
execrado por vários outros, o Cinema Brasileiro sobrevive a mais um ano
extremamente difícil – não só para os seus meios de produção e distribuição
internos, mas sim para a construção e manutenção da identidade cultural do país
como um todo e junto das demais formas de expressões artísticas. Fato que não pode
ser negado é o de que, apesar desse angustiante período de turbulências, os
profissionais da área continuam trabalhando de maneira firme e corajosa para
entregarem projetos cada vez mais audaciosos e inventivos que ainda colocam o
Brasil entre os principais mercados cinematográficos do planeta.
Procurando
garantir um espaço cativo para boa parte das produções nacionais lançadas a
cada semana, o Rotina Cinematográfica vem, pelo quarto ano consecutivo, apresentar
a sua lista com os melhores filmes da temporada. Destacaremos as dez obras que
mais nos chamaram a atenção ao longo de 2018, sempre acreditando e batalhando
para que todas elas conquistem um espaço maior em nossos circuitos de exibição no
futuro – afinal, divulgar e valorizar o nosso cinema é uma atividade extremamente
necessária!
Antes de
divulgarmos a relação final, é importante lembrar que os critérios adotados para
estabelecer quais seriam os títulos escolhidos para compor essa seleção são
subjetivos e ficam restritos apenas aos filmes
que estrearam em 2018 nas salas de cinema do país através do circuito
comercial, ou aqueles lançados diretamente em vídeo ou em plataformas de
streaming.
Depois deste
breve esclarecimento, acompanhem agora a nossa Lista com Os Dez Melhores Filmes Nacionais de 2018 (em ordem decrescente):
10º. LUGAR: “O ANIMAL CORDIAL”
(O
Animal Cordial, Brasil, 2017) - de Gabriela Amaral Almeida
Data da Estreia: 9 de agosto de 2018
Malicioso,
sagaz e extremamente tenso, “O Animal Cordial” carrega todo o fôlego e potência
que o prodigioso cinema de gênero que vem sendo realizado no país precisa para
continuar conquistando a crítica e o público em geral. Assim como em seus
aclamados curtas, a realizadora Gabriela Amaral Almeida consegue, mais uma vez,
equilibrar muito bem as doses de horror e de suspense para criar subterfúgios
que enganem o espectador a partir de eventos comuns que começam a tomar rumos
absolutamente inesperados. Inácio (Murilo Benício) é dono de um sofisticado
restaurante de classe média alta na cidade de São Paulo que, próximo ao fim do
expediente, acaba sendo surpreendido por dois bandidos armados que invadem o
seu estabelecimento e dão início a um violento jogo de descortesias e
inospitalidades.
Despido de
sua aparente civilidade, Inácio começa a confrontar Magno (Humberto Carrão), um
dos criminosos, dando início a um embate físico e psicológico que se prolongará
por toda a madrugada e que também passa a envolver sua fiel atendente Sara
(Luciana Paes), o desconfiado cozinheiro Djair (Irandhir Santos), bem como os
três últimos clientes que ainda jantavam no momento do assalto. A partir desse
ponto, as reviravoltas provocadas pelos personagens criam dinâmicas sufocantes
em um ambiente dominado pela hostilidade, preconizando a frenética luta pela
sobrevivência em um espaço restrito. Ao final, podemos observar através deste
brilhante e cuidadoso estudo de personalidades que, da persuasão à loucura, o
ser humano pode alcançar o cerne de sua brutalidade desenvolvida em seu
substrato emocional mais profundo.
![]() |
"O Animal Cordial" (2017) de Gabriela Amaral Almeida - RT Features [br] | Canal Brasil [br] |
9º. LUGAR: “BENZINHO”
(Benzinho,
Brasil | Uruguai | Alemanha, 2018) - de Gustavo Pizzi
Data da Estreia: 23 de agosto de 2018
Carregado por
uma força emocional contagiante, “Benzinho” arranca lágrimas de qualquer pessoa
que o assista, justamente por despertar sensações tão afetuosas e singelas que
as fazem relembrar dos mais íntimos e sinceros convívios familiares e por
demonstrar que essa relação nem sempre é uma maravilha, sobretudo quando os
conflitos naturais entre pais e filhos passam a desencadear uma angustiante
espiral de sentimentos. Tentando administrar a instabilidade financeira do
marido e os atritos conjugais da irmã, Irene (Karine Teles) ainda precisa de
toda energia e versatilidade que uma mãe de quatro filhos possui para colocar
em ordem uma casa que sempre parece estar virada do avesso. Seus problemas
parecem dobrar de tamanho quando Fernando (Konstantinos Sarris), seu
primogênito, recebe um convite para jogar handebol profissionalmente na
Alemanha.
Uma avalanche
de ansiedades e incertezas invadem a vida dessa família. Alegrias, chateações e
sofrimentos passam a fazer parte da rotina de cada um dos personagens e ajudam
a compor essa história absolutamente apaixonante, um legítimo recorte da
brasileiríssima expressão “gente como a gente” condensado nos olhos marejados
de Irene que revelam o sentimento de saudade que vai preenchendo a tela nos
momentos finais do filme, mesmo antes de Fernando partir para a sua jornada de
descobertas. Auxiliado por um elenco de apoio poderoso, que conta com os nomes
de Adriana Esteves, César Troncoso e Otávio Müller, o diretor e produtor
Gustavo Pizzi demonstra muito arrojo e maturidade ao conduzir o segundo
trabalho em longa-metragem, mesmo após um intervalo de oito anos que separam os
lançamentos de “Benzinho” e do não
menos inventivo “Riscado” (2010).
![]() |
"Benzinho" (2018) de Gustavo Pizzi - Bubbles Project [br] | TV Zero [br] | Baleia Filmes [br] | Mutante Cine [uy] |
8º. LUGAR: “HISTÓRIAS QUE NOSSO CINEMA
(NÃO) CONTAVA”
(Histórias
que Nosso Cinema (não) Contava, Brasil, 2018) - de Fernanda Pessoa
Data da Estreia: 23 de agosto de 2018
Com uma
premissa absurdamente brilhante, “Histórias
que Nosso Cinema (não) Contava” reescreve parte da memória cultural
coletiva brasileira através de um pequeno recorte do período da ditadura
militar retratado de forma icônica em uma compilação de trechos dos mais
famosos filmes da era da pornochanchada, gênero cinematográfico de teor cômico
e erótico que invadiu e dominou as telas do país ao longo das décadas de 70 e
80. Fora a nudez e o sexo, esse fenômeno popular camuflava o seu viés crítico
ao brincar com a (in)consciência de uma sociedade que tratava com humor o
machismo, a homofobia e o racismo, temas considerados tabus à época. Por outro
lado, o senso de civilidade dava as caras ao discutir abertamente assuntos
inqualificáveis como a luta armada e a violência do Estado, por exemplo.
As mensagens
estavam ali para quem quisesse absorver, em parte, muito graças ao perfil
dissimulado de alguns diretores que driblavam a censura para conseguir deixar
fragmentos de seus recados impressos nas películas, tal como as denúncias
praticamente silenciosas e quase martirizáveis contra a tortura – ou,
simplesmente, por aqueles que tentavam vender a ideia do “milagre econômico”
pormenorizada pela modernização do Brasil nos chamados “anos de chumbo”. É de
se louvar o árduo e minucioso processo de pesquisa da cineasta Fernanda Pessoa,
que teve o cuidado de selecionar cena por cena das dezenas de filmes que foram
incluídos no corte final; tudo isso somado ao categórico e impecável trabalho
de montagem de sua equipe transformam este documentário em mais um importante
instrumento de investigação da nossa história política e social.
![]() |
"Histórias que Nosso Cinema (não) Contava" (2018) de Fernanda Pessoa - Pessoa Produções [br] | Studio Riff [br] |
7º. LUGAR: “BARONESA”
(Baronesa,
Brasil, 2017) - de Juliana Antunes
Data da Estreia: 14 de junho de 2018
Legítimo
representante do Cinema de Guerrilha, “Baronesa”
mistura o documentário e a ficção para retratar, de forma íntegra e corajosa, o
cotidiano sofrido de comunidades humildes que tentam se desenvolver à margem
dos impiedosos avanços de uma grande metrópole. Lidando com a opressão habitual
que marca essa escala de interações, a câmera procura conquistar o seu espaço
em um ambiente que, na maioria das vezes, ainda insiste em ser atroz, misógino
e truculento. As lentes passam então a registrar a relação de cumplicidade
entre Andreia e Leidiane, amigas de longa data que moram em casas vizinhas na
Vila Mariquinhas, situada na Zona Norte de Belo Horizonte. As duas vivem
compartilhando angústias, receios, sonhos e planos para o futuro; mas quando um
anunciado conflito entre traficantes interrompe uma dessas conversas, Andreia
pensa em deixar o bairro imediatamente.
Áspero,
poético e puramente verdadeiro, o filme não economiza em clemência e nem em
intensidade ao tratar a relação direta do ser humano com a violência sob o
ponto de vista feminino, o que acaba alumiando a personalidade forte e visceral
de suas protagonistas. Vencedor da Competitiva Aurora na Mostra de Cinema de
Tiradentes em 2017, o vigoroso longa-metragem de estreia de Juliana Antunes
enriquece ainda mais a atual safra do cinema mineiro, colocando em evidência
uma grande geração de jovens cineastas que vêm se destacando no cenário
nacional desde o início desta última década. Com narrativas inquietas e
questionadoras, as produções independentes realizadas no Estado procuram
estampar nas telas o quanto é dura a vida nas periferias.
![]() |
"Baronesa" (2017) de Juliana Antunes - Ventura [br] | Filmes de Plástico [br] | Katásia Filmes [br] | Pepeka Pictures [br] |
6º. LUGAR: “PELA JANELA”
(Pela
Janela, Brasil | Argentina, 2017) - de Caroline Leone
Data da Estreia: 18 de janeiro de 2018
Afeita ao magnetismo
do teatro e com algumas participações de destaque na televisão, a veterana
atriz Magali Biff ainda não havia demonstrado todas as suas qualidades em uma
tela de cinema até se envolver de três projetos muito interessantes ao longo de
2017, dentre os quais o doloroso e inspirador “Pela Janela”, filme no qual é a grande protagonista, vem recebendo
constantes elogios desde a sua estreia no início do ano. A trama se desenvolve
a partir de uma difícil situação enfrentada por sua personagem, Rosália, uma
modesta operária que passou a maior parte da vida se dedicando ao trabalho como
chefe da linha de produção em uma moderna fábrica de reatores elétricos na
periferia de São Paulo. De forma inesperada, ela acaba sendo dispensada, pois o
patrão alega que não é mais necessário mantê-la no quadro da empresa.
Abatida e
emocionalmente desmoronada, Rosália busca conforto nos enternecidos braços do
irmão, José (Cacá Amaral), que trabalha como motorista particular de uma
tradicional família rica. Com medo que a irmã mergulhe em um estado depressivo
mais grave, ficando sozinha na casa que dividem, ele decide fazer um convite
para que ela o acompanhe em uma viagem de carro até Buenos Aires. Da mais
sincera relação de cumplicidade entre os dois, surge o mote que norteia esta
comovente jornada de autoconhecimento na qual Rosália, apesar de relutar,
começa a abrir janelas para se reconhecer em mundos completamente diferentes,
mesmo estando tão próxima de realidades sociais tão semelhantes à sua.
![]() |
"Pela Janela" (2017) de Caroline Leone - Dezenove Som e Imagem [br] |
5º. LUGAR: “AS BOAS MANEIRAS”
(As
Boas Maneiras, Brasil | França | Alemanha, 2017) - de Juliana Rojas e Marco
Dutra
Data da Estreia: 7 de junho de 2018
Em franco
crescimento no mercado de produção audiovisual, o cinema de gênero feito no
Brasil apresenta aspectos tão peculiares que já é capaz de dominar os ambientes
aonde reverberam a ambição e a ousadia, expressas tanto em suas novas formas de
abordagem quanto nas suas principais influências externas. Maiores nomes do
segmento na contemporaneidade, Juliana Rojas e Marco Dutra misturam – mais uma
vez – fantasia e realidade para compor aquele que talvez seja o projeto
cinematográfico mais criativo dessa temporada. “As Boas Maneiras” conta a extraordinária história de Clara (Isabél
Zuaa), contratada para acompanhar os últimos dias da gestação de sua nova
patroa, a rica e solitária Ana (Marjorie Estiano), auxiliando nos atuais e
futuros cuidados com o bebê e organizando os demais afazeres domésticos em um
enorme apartamento de um bairro nobre de São Paulo.
As duas
acabam desenvolvendo um forte e afetuoso vínculo de amizade, mas o sobrenatural
começa a interferir de forma direta nessa relação quando Ana passa a apresentar
comportamentos cada vez mais estranhos em noites de lua cheia. Manifestadas
através de atitudes agressivas que afloram uma avidez carnal e sanguinolenta,
as suas constantes crises de sonambulismo são responsáveis por descortinar a
atmosfera de medo e desejo que define, com absurda subjetividade e sutileza, as
bases para um espantoso, sufocante e violento terror psicológico. Marcado pela
transição súbita entre o primeiro e o segundo atos, os diretores continua
demonstrando condescendência frente aos recortes sociais que fez, mesmo após o
impetuoso relaxamento que imprimem na narrativa. Por outro lado, o filme não
deixa de transferir todas as alegorias e fabulações para a tela, ao mostrar
Clara, anos depois, tendo de cuidar de Joel (Miguel Lobo), rebento licantropo
de Ana.
4º. LUGAR: “PRAÇA PARIS”
(Praça
Paris, Portugal | Argentina | Brasil, 2017) - de Lúcia Murat
Data da Estreia: 26 de abril de 2018
Glória (Grace
Passô) trabalha como ascensorista na Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Ao longo do dia, centenas de pessoas transitam apressadas pelo seu elevador sem
sequer trocar o mínimo de cordialidades – atitudes que praticamente transformam
a operadora em mais uma das milhares de criaturas que vagam invisíveis aos
olhos da sociedade. Moradora do Morro da Providência, favela mais antiga do
país, ela ainda precisa de muita coragem para continuar levando a vida adiante,
mesmo enfrentando alguns problemas com o irmão, preso por chefiar o tráfico
local, e tendo que lidar com os traumas adquiridos através do convívio com um
pai extremamente abusivo durante a infância. Decidida a mudar os rumos de seu
destino, Glória passa a frequentar sessões terapia oferecidas gratuitamente
pela própria UERJ.
Ela começa a
ser atendida por Camila (Joana de Verona), uma jovem portuguesa que chegou ao
Brasil para concluir os estudos de pós-graduação em psicanálise e violência
urbana. A partir desse momento, a construção da narrativa passa a incomodar o
olhar benévolo do espectador, que passa a acompanhar, de forma apreensiva, o
clima de tensão que cresce a cada consulta, justamente por reunir na mesma sala
duas mulheres de mundos absolutamente diferentes. Enquanto uma delas enxerga na
própria vivência a chance para exorcizar todos os seus demônios, a outra –
aparentemente mais preparada para lidar com os dilemas da racionalidade – se
encontra completamente perdida ao perceber que um mundo construído por
significações não se encaixa em uma realidade hostil. Com uma direção precisa
que traça uma crítica forte, mas ao mesmo tempo sensível, ao cotidiano perverso
de uma grande cidade, Lúcia Murat entrega ao público uma de suas obras mais
complexas e urgentes.
![]() |
"Praça Paris" (2017) de Lúcia Murat - CEPA Audiovisual [ar] | Fado Filmes [pt] | Rede Telecine [br] | Taiga Filmes [br] |
3º. LUGAR: “CAFÉ COM CANELA”
(Café
com Canela, Brasil, 2017) - de Ary Rosa e Glenda Nicácio
Data da Estreia: 23 de agosto de 2018
Longa-metragem
de estreia de Ary Rosa e Glenda Nicácio, promissora dupla de cineastas baianos,
“Café com Canela” vai até o coração
do Recôncavo para nos apresentar o cotidiano de uma comunidade humilde que se
sustenta na base do afeto, da amizade e da resistência para sobreviver ao
tortuoso caminho de encontros e desencontros que todo ser humano deve percorrer
ao longo de sua breve existência. Reunidos em um animado churrasco na casa de
Violeta (Aline Brunne), um grupo de amigos começa a relembrar alguns dos fatos
que permanecerão marcados na vida de cada um – que vão desde de situações
constrangedoramente engraçadas, passando por inspiradoras histórias de amor, e
chegando até aos relatos mais comoventes sobre a irreparável dor de se perder
alguém tão querido.
A partir do
registro desse encontro, voltamos no tempo para mergulhar profundamente nos
dramas de Margarida (Valdinéia Soriano), uma mulher amargurada que decide se
afastar de qualquer tipo de convívio social após a morte do filho. Ela se
separa do marido, perde o contato com os amigos mais próximos e acaba se
isolando por completo no interior de sua residência. Através de fragmentos
narrativos que, de maneira proposital, não obedecem uma cronologia linear,
procuramos entender quais os reais motivos que levaram à essa clausura e nos
emocionamos com a sensível jornada de redescobertas e transformações que
Margarida vive a partir do momento em que Violeta bate à sua porta. Poética e
extremamente representativa, a realização de “Café com Canela” abala toda uma
estrutura sentimental ao evocar as virtudes mais singelas e poderosas que
emanam da alma e que são tão caras à construção de nossa identidade moral.
![]() |
"Café com Canela" (2017) de Ary Rosa e Glenda Nicácio Rosza Filmes Produções [br] | Arco Audiovisual [br] | Petrobrás [br] |
2º. LUGAR: “PIRIPKURA”
(Piripkura,
Brasil, 2017) - de Mariana Oliva, Renata Terra e Bruno Jorge
Data da Estreia: 1º de março de 2018
Pelo segundo
ano consecutivo, um documentário que aborda de forma tão clara os principais
desafios da questão indígena e o absurdo retrocesso em relação às políticas de
demarcação de terras figura na lista de melhores filmes brasileiros do ano,
demonstrando o quanto essas discussões continuam urgentes em nosso país. “Piripkura” acompanha de perto os
desafios de Jair Candor, servidor de carreira da FUNAI, que há quase 30 anos
luta para manter contato com Pakyî e Tamandua, últimos sobreviventes da etnia
nômade que dá nome ao filme. Os índios vivem em uma pequena faixa de reserva
florestal no Estado do Mato Grosso que, ano após ano, se encontra cada vez mais
pressionada pelos implacáveis avanços de grandes fazendas e da indústria
madeireira.
As expedições
lideradas por Jair ganham a eventual companhia de Rita, irmã de Pakyî e tia de
Tamandua, terceira remanescente da tribo que há muito tempo procurou refúgio em
outra região, justamente por temer a violência que estava dizimando o seu povo.
Envolto nos debates de questões sociais, o altruísmo é constantemente
massacrado pelo insensato jogo de interesses que não dá a mínima para a
preservação do patrimônio histórico e ambiental. Equilibrados entre a crueza e
a sensibilidade, os olhares de Mariana Oliva, Renata Terra e Bruno Jorge
capturam, com extremo arrojo e precisão, os capítulos mais importantes dessa
sedutora crônica de resistência – que acaba sendo construída na base do acaso
através de um desfecho emocionante que transcende os limites da humanidade ao
registrar o raro encontro entre o indigenista e os nativos.
![]() |
"Piripkura" (2017) de Mariana Oliva, Renata Terra e Bruno Jorge Zeza Filmes [br] | Maria Farinha Filmes [br] | Grifa Filmes [br] |
1º. LUGAR: “ARÁBIA”
(Arábia,
Brasil, 2017) - de Affonso Uchôa e João Dumans
Data da Estreia: 5 de abril de 2018
Após ser
consagrado como o grande vencedor da 50ª edição do Festival de Brasília,
realizada em 2017, “Arábia” já se
transformava em um dos maiores clássicos contemporâneos do Cinema Brasileiro,
justamente pelo fato de abordar, de forma bastante engajada, temáticas tão
caras à realidade e ao momento delicado pelo qual a nossa sociedade vem
passando. Com uma narrativa densa e essencialmente humana, o longa traça a
dramática jornada emocional de Cristiano (Aristides de Sousa), um homem
solitário que decide cair na estrada para tentar ganhar a vida. Ele é apenas
mais uma daquelas criaturas socialmente invisíveis, um indivíduo marginalizado
que jamais teria a sua a história conhecida caso não tivesse sido vítima de um
trágico acidente de trabalho em uma siderúrgica na cidade de Ouro Preto.
Auxiliando
nos cuidados com o servidor hospitalizado, o jovem André (Murilo Caliari) acaba
encontrando um simples caderno quando vai à casa de Cristiano para resgatar
alguns de seus pertences. O que por acaso se descobre ao folhear algumas das
páginas é que o operário mantinha uma espécie de diário manuscrito no qual
rabiscava impressões sobre cada um dos destinos tomou, reflexões acerca dos
aprendizados que acumulou em cada experiência profissional e lamentos por conta
dos amigos e dos amores que foi deixando pelo caminho. Livremente inspirado em
um dos contos do livro “Dublinenses”
de James Joyce, o roteiro escrito por Affonso Uchôa e João Dumans é sustentado
por uma linguagem absolutamente particular que, de certo modo, consegue
absorver as principais questões políticas do país e transferir para o âmago
pessoal de seu protagonista que, por sua vez, retransmite todos os seus dilemas
e insatisfações para uma realidade mais palpável.
![]() |
"Arábia" (2017) de Affonso Uchôa e João Dumans - Katásia Filmes [br] | Vasto Mundo [br] |
Para finalizar, é importante ressaltarmos que uma lista
com apenas dez títulos é muito pequena frente ao grande número de produções de
qualidade que foram lançadas ao longo deste último ano. Filmes que sempre nos
farão querer descobrir um pouco mais sobre todos os tipos cinema que vêm sendo
feitos na nossa própria casa. Dessa forma, resolvemos incluir mais uma pequena
relação de trabalhos que também se encaixam em algumas categorias que julgamos
importantes. Confira:
Também mereceram destaque este ano: “Aos Teus Olhos”
(2017) de Carolina Jabor; “Todos os
Paulos do Mundo” (2017) de Rodrigo de Oliveira e Gustavo Ribeiro; “O Desmonte do Monte” (2018) de Sinai
Sganzerla; “Ex-Pajé” (2018) de Luiz
Bolognesi; “O Processo” (2018) de Maria
Augusta Ramos; e “Tropykaos” (2018)
de Daniel Lisboa.
Não vimos e nem veremos: “O
Candidato Honesto 2” (2018) de Roberto Santucci.
Ainda faltam ser conferidos: “Canastra Suja”
(2016) de Caio Sóh; “Super Orquestra
Arcoverdense de Ritmos Americanos” (2016) de Sérgio Oliveira; “O Beijo no Asfalto” (2018) de Murilo
Benício; “Ferrugem” (2018) de Aly Muritiba; “A Moça do Calendário” (2018) de Helena
Ignez; e “Tinta Bruta” (2018) de Filipe
Matzembacher e Marcio Reolon.
Podem obter grande destaque em 2019: “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos” (2018) de João Salaviza e Renée Nader
Messora; “Humberto Mauro” (2018) de
André Di Mauro; “A Sombra do Pai”
(2018) de Gabriela Amaral Almeida; “Temporada”
(2018) de André Novais Oliveira; “Tito e
os Pássaros" (2018) de Gustavo Steinberg, Gabriel Bitar e André Catoto;
e “Turma da Mônica: Laços” (2019) de Daniel
Rezende.
Maior expectativa para 2019: “Sócrates”
(2018) de Alex Moratto.
(*) Lembrando
que críticas, apontamentos de injustiças ou esquecimentos podem ser expressos
nos comentários... ;-)
(**) Também
não descartaremos os elogios! :-D
Confira também as listas
com “Os Dez Melhores Filmes Nacionais”
elaboradas pelo Rotina Cinematográfica em anos anteriores:
Nosso maior
desejo é que ao ano de 2019 continue nos presenteando com filmes tão
espetaculares e importantes quanto os desta temporada! A cultura é essencial
para a construção de nossa civilidade; e resistir a tempos de apatia será
absolutamente fundamental nesses próximos meses. Nunca, mas nunca se esqueçam
de valorizar o nosso produto...
VIVA SEMPRE O
CINEMA NACIONAL!
Adorei a lista, Arábia com toda certeza foi a maior surpresa que tivemos esse ano. senti falta de Paraíso Perdido de Monique Gardenberg.
ResponderExcluir